1964: Eu entre a Beatlemania e o Golpe Militar

Posted by Cornélio Melo Category: Colaborações

Quem me conhece sabe da minha paixão por Niterói. Aqui, nasci, “me” criei, estudei, casei, formei família e exerci intensamente meu hobby musical… não necessariamente nessa ordem. Nas duas últimas semanas, fiz uma corrida por bares e restaurantes de Niterói, sozinho ou com amigos. No Iate Clube Brasileiro, assisti ao show que marcou a volta de Os Quem, que unidos aos Os Únicos, duas ótimas bandas niteroienses sessentistas, adotaram o nome de Os Únicos Quem. Muita gente bonita, muitos encontros que há anos estavam perdidos e, acima de tudo, boa música!

MAC NiteróiFui ao Maria da Praia, ótima e linda casa na Praia de Piratininga, dessa vez acompanhado dos parceiros de música Névio, (ex-Corsários), Luiz Antonio Mello (ex-Os Imortais e fundador da rádio “Maldita FM”), Fernando com sua Milena, além da jornalista musical e minha filha, Chris (ex-banda ECT), com seu marido Marco. Casa cheia, tudo de bom ao som de Léo, André, Rodrigo “Bolinha”, meu eterno “batera” (ele toca comigo na Máquina do Tempo), entre outras feras, tocando o melhor de Beatles numa comemoração dos 50 anos de lançamento dos caras: em 1964, nos EUA, eles apareceram no programa de TV Ed Sullivan Show. Nota mil!

Assisti no ótimo botequim Granel, também em Piratininga, ao show que acontece todas as quintas-feiras com a dupla veterana Cássio Tucunduva e Nandão Coverdose, meus parceiros e amigos de longa data. Um duo de violão, guitarra e vozes para ninguém colocar defeito. Só o melhor dos Beatles! Encontros inesperados, como sempre, degustei algumas “stellinhas” na deliciosa companhia de Caíque e Cristina Fellows, Gilberto Chaudon, grande empresário da música, entre outros tantos amigos.

BeatlesContinuando na corrida em que me dei conta de que Niterói ainda é o reduto da Beatlemania, bati ponto no domingo no tradicional Velho Armazém (Dimas, cadê você???), em São Francisco, ouvindo o delicioso som dos amigos e parceiros Cássio, Kika, Nandão e Sérginho no projeto “Fugindo do Faustão”. Na mesma casa, assisti, em outro momento, às bandas Krya – dos meus parceiros Liszt, Silvinho, Leleco e Comprido -, fazendo Beatles com a honestidade de sempre, e à banda Alma de Borracha – que tem a competente bateria de André somada à não menor competência dos demais membros do veterano grupo -, especialista em Beatles.

Fechando a maratona Beatles, fui numa noite de quarta-feira ao Studio El Sonoro, do meu filho e parceiro musical Felipe Melo (guitarrista da banda Taurus, Sanatore e Máquina do Tempo) para um encontro, no mínimo antológico, com um cara, ou melhor, com o médico respeitadíssimo e músico sessentista que agora volta a se reunir para tocar com amigos: Cadu Cabral! Cadu com seu irmão João Carlos, com Candinho e Fabinho (in memorian) formavam Os Eletras nos 60. Fazia mais de 20 anos que não nos encontrávamos. Lembro com saudade que, em 1967, ele com Os Eletras e eu com Os Trogloditas protagonizamos a festa de fim de ano dos alunos do CEN (Centro Educacional de Niterói), num show “histórico” em que disputávamos, além das menininhas, o título de “A Melhor Banda” (rsrsrs…). Beatles em profusão!!! E, num papo animado, Felipe dizia que a semana no Studio só contemplou bandas de Beatles, com pessoas usando camisetas dos quatro de Liverpool. Enfim, uma super energia Beatle!

Trampolim de Niterói, que fez a alegria dos jovens banhistas entre 1936 e 1965

Trampolim de Niterói, que fez a alegria dos jovens banhistas entre 1936 e 1965

E aí, você deve estar se perguntando: o que tem a ver o título dessa matéria, envolvendo o Golpe Militar de 64? Simples! Enquanto Eu (desculpem-me o destaque, mas é uma forma de justificar o texto em primeira pessoa), mal “entrado” nos 13 anos de idade, em março de 1964, ocasião em que trocava a bola de gude, a cafifa (pipa, no Rio de Janeiro) e as peripécias no trampolim da Praia de Icaraí pelas guitarras, fui apresentado aos Beatles pela música “I Want To Hold Your Hand”, explodida na mídia no mesmo ano em que a ditadura instalava-se no país. Lá se vão 50 anos!

Você também deve estar se perguntando: “Será que esse cara teve problemas com a Ditadura?” Não em um primeiro momento. Mas, em 1969, já com 18 anos, fui “em cana” junto com meus amigos enquanto fazíamos uma “festinha” em nossa república, na cidade de Valença, onde então estudava e passava a semana. Por que? Porque além da “festinha” ser meio barra pesada, tínhamos nas paredes dos nossos quartos inscrições do tipo “maconha é saúde”, “tome LSD e seja feliz”, “viva Che Guevara”, “Fidel é a solução”, entre outras frases da moda naquela era hippie-psicodélica. E, é claro, tudo ao som do “White Álbum”, do “Sgt. Peppers” e do “Abbey Road” dos Beatles. Mas isso, como diz Charles Gavin, “é uma outra história”.

Nota da editora: Esse texto me fez ter vontade de contar que foi “me” criando e convivendo com meu pai (hoje meu parceiro/colaborador aqui no GarotaFM) que entendi muita coisa sobre música e sobre como conviver com ela sem precisar ser um popstar. Com ele, aprendi o que acabou se tornando meu ofício… apreciar e divulgar o que o mercado tem de bom (o mercado dos famosos e o dos não famosos). Lamento não poder acompanhar tão de perto essa cena apresentada por ele, mas faço uma reflexão. Pra quem foi criado(a) em Niterói, como eu, e vive dizendo que a cidade não tem mais espaços dedicados à música ao vivo, esse texto é uma prova de que o que falta é um público interessado. Participei de um dos eventos citados por meu pai e reparei que poucos na casa prestavam atenção na banda em destaque. Desejo que a cidade receba ou “crie” cada vez mais pessoas como ele e como os nomes que citou em seu texto, que tentam não deixar a música dos “não popstars” morrer. 

4 thoughts on “1964: Eu entre a Beatlemania e o Golpe Militar

  1. Cornélio, meu amigo adoro ler suas histórias e principalmente conversar com você! Aquele abraço.
    Kadinho Tiengo.

  2. Eu vi, com esse olhos que a terra a de comer, a explosão do trampolim de Icaraí. Eu era um garotinho. Foi a primeira vez que vi um mergulhador profissional (Homem rã)parecia um super herói. Foi o máximo! Inesquecível!

  3. Que delícia de leitura! Me fez desejar – ainda mais – ter vivido outra época. Que maravilha! Como os tempos mudaram… Infelizmente! E o que podemos ver é que o interesse pela essência musical, na minha opinião, diminuiu. Quer dizer, hoje a cultura ‘pop’ é mais procurada, mais idolatrada. Antigamente é que devia ser bom… frequentar casas de shows menores, com públicos não tão grandes e bandas GIGANTES (talvez não de fama mas com certeza de talento). É uma pena. Eu sei que a cultura da sociedade sofre suas adaptações com o passar dos anos, e hoje em dia, tenhamos muita fluidez, muitas trocas culturais, tanto referenciais locais como sociais. Mas o que lamento mesmo é o indivíduo que entra em um estabelecimento e se preocupa mais com o que está em sua mesa, ao invés de olhar com atenção o couvert musical. Nem sempre o que enche é de comer. Às vezes é preciso encher além do estômago ou da boca, mas encher mesmo os ouvidos e o coração.

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