‘Zélia Duncan e Zeca Baleiro’ levam ‘discoteca afetiva’ ao Net Rio

Posted by Chris Fuscaldo Category: Shows e eventos

Duas vozes, alguns violões, ukelele e bandolim e dois grandes pequenos nomes começados por Z. Acompanhados desses poucos instrumentos – mas dominando os mais poderosos deles, suas vozes – Zeca Baleiro e Zélia Duncan trouxeram finalmente ao Rio de Janeiro o show que lançaram em janeiro, em Salvador, e que já rodou algumas outras cidades do país. E, com repertório surpreendente de composições próprias e canções de suas “discotecas afetivas”, além de muitas boas histórias (e piadas), agradaram a uma plateia dividida, porém complementar na primeira noite, a desta segunda-feira (22/09), no Teatro Net Rio.

Zélia Duncan e Zeca Baleiro por Dudu Leal 2

Zélia e Zeca por Dudu Leal

O show começou solene, com Zeca tocando violão e a dupla fazendo um lindo dueto de graves em Pássaro, canção do repertório da dupla Sá & Guarabyra. Alternando vozes, ZB e ZD adiaram a chegada do pop-rock-folk-MPB e cantaram Curare, de Bororó. Ao final, Zélia assumiu o violão para apresentar (com Zeca iniciando a cantoria), do seu repertório, Tudo Sobre Você, parceria da cantora com John Ulhoa gravada no álbum Pelo Sabor do Gesto (2009).

“A gente faz um exercício para não dizer nada até a terceira música”, brincou Zélia, antes de explicar como se deu essa união: “Esse projeto está acontecendo porque várias duplas estavam programando shows, mas o projeto dançou e resolvemos fazer justiça com as próprias mãos.”

Segundo Zeca, costumam dizer que o que aproxima dois artistas é dinheiro ou sexo. Zélia anunciou que tocariam a canção que inaugurou a parceria dos dois, Se Um Dia Me Quiseres, também gravada em Pelo Sabor…, e brincou que o tema tinha tudo a ver com o que Zeca falou. Na sequência, a cantora confessou que costuma fingir ser a autora de Alma Nova, canção do maranhense registrada no álbum Baladas do Asfalto e Outros Blues (2005).

“Quando a gente resolveu juntar os terengues…”
“Juntar o que, Zeca?”
“Os terengues… Não falam isso em Niterói?”
“Não!”
“Bom, quando a gente resolveu juntar os terengues… no palco… a gente combinou que ia pensar em músicas de autores da nossa discoteca afetiva. Zélia sacou uma música incrível dos anos 70 do Erasmo e do Roberto, que a gente acredita ser mais do Erasmo.”

Do baú pós-jovem-guardista, a cantora sacou a lindíssima Grilos, composição de Erasmo Carlos e Roberto Carlos gravada pelo Tremendão em 1972, no álbum Sonhos E Memórias: 1941-1972. Ele, por sua vez, sugeriu que a parceira interpretasse Mulheres, um clássico de Martinho da Vila totalmente de acordo com o roteiro do show. E, olhando para Zeca no trecho “Mas nenhuma delas me fez tão feliz Como você me faz”, ela cumpriu seu papel mostrando, mais uma vez, que tem o samba na voz e o teatro na alma. O músico aproveitou o violão para fazer uma linha de baixo sensacional.

Juntos e antes da separação, eles ainda fizeram O Amor é Velho-Menina, de Tom Zé, e Fox Baiano, música inédita dos dois composta sobre a letra do baiano Luiz Galvão (“Poeta da MPB, nada menos que o letrista dos Novos Baianos, que tem aquelas lindas, loucas, psicodélicas e psicotrópicas canções”, comentou Zeca). Foi nesse momento que ZB assumiu um ukelele enquanto Zélia se manteve no violão.

Momento solo

Zélia Duncan e Zeca Baleiro por Dudu Leal (Foto de arquivo)

Zélia Duncan e Zeca Baleiro por Dudu Leal (arquivo)

Enquanto Zeca estava fora do palco, Zélia interpretou Tevê (O Coração do Homem-Bomba – Vol. 2, 2008) e Quase Nada (Líricas, 2000), do repertório dele (fazendo um trompete com a boca na segunda música). E, antes de cantar Eu Queria Ela, um clássico de Riachão – o sambista de 92 anos que ela redescobriu ao trabalhar na pesquisa para a criação do roteiro do 25º Prêmio da Música Brasileira – a cantora relembrou um episódio ocorrido logo que Catedral estourou. Em uma loja de discos de Curitiba, ZD ouviu um menino perguntar se o cara tinha o disco com a música da novela. “É lenta ou rápida?”, perguntou o atendente. “Lenta”, disse o rapaz. “Quem canta é homem ou mulher?” E o cliente: “Não sei!” (Pausa dramática) “Sou eu”, contou ZD, emendando Me Revelar (dela com Christiaan Oyens presente no álbum Sortimento, de 2001), mas errando uma nota ao se emocionar com a participação da plateia.

Zeca voltou ao palco e, juntos, eles cantaram outras duas novas parcerias: Escancarado e Museu Íntimo. Ao ficar só, ele interpretou Não Vá Ainda, da parceira com Oyens gravada em 1994, no primeiro disco dela como Zélia Duncan (depois do único como Zélia Cristina), e Opus 2, canção conhecidíssima de Antônio Carlos & Jocafi que rendeu risadas por causa de um episódio narrado pelo artista: “Uma colunista do Maranhão fez uma entrevista célebre com a cantora baiana Maria Creuza, que era casada com um deles, e perguntou: ‘Como é ser casada com Antônio Carlos e Jocafi?’ E Maria Creuza respondeu: ‘Sou casada só com Antônio Carlos.’ Virou piada estadual.”

Zeca fez piada também sobre o nome do show, porque, na verdade (apesar de eu estar escrevendo sempre Zeca antes de Zélia), o nome de Zélia vem primeiro no anúncio: “Zélia Duncan e Zeca Baleiro“. Segundo o cantor, foi questão de gentileza: “Nesse caso, foi ladies first”. Mas, maroto, contou que, quando se juntou com Fagner, recebeu um e-mail do sobrinho, na época adolescente, dando-lhe um conselho:”Tio, sempre que se juntar em dupla com outro artista, coloque seu nome em segundo lugar porque tenho pesquisado que, quando morre algum, sempre morre o primeiro. Veja os exemplos: João Paulo & Daniel, Leandro & Leonardo e Claudinho & Buchecha.” Arrancando risadas, ele seguiu: “Claro que não é o caso aqui. Aposto que Zélia deve estar pesquisando no Google exemplos que desmintam minha tese”, escancarou antes de entoar a sua Babylon, do álbum Líricas (2000).

Provavelmente no Maranhão, Estado brasileiro onde o reggae tem o seu lugar, Nos Lençóis Desse Reggae (do disco de 1994) foi a primeira música de Zélia que Zeca ouviu. “Diferente do garoto de Curitiba, achei um timbre incomum e bonito. Fiquei muito seduzido.” Ao tocar a música, trocou “Marrakesh” por “Maranhão” em um dos trechos. Zélia entrou e terminou o número com ele, emendando com Money in my Pocket, de Dennis Brown , cantor de reggae jamaicano apelidado por Bob Marley de “Príncipedo Reggae” e falecido em 1999.

Coração Aprisionado, composição de Luli e Lucina gravada por Ney Matogrosso no LP Sujeito Estranho (1980), A Natureza das Coisas, de Accioly Neto (mas famosa com Elba Ramalho), Sentidos (Zélia e Oyens, 1994) com Zélia ao bandolim e Zeca fazendo a linha de baixo no violão (confirmando ser perfeito o casamento de graves com graves e também o de graves com agudos, que ambos mostraram saber fazer com as cordas, tanto as dos violões e afins quanto as vocais) e Bandeira (Zeca Baleiro no disco Por Onde Andará Stephen Fry?, 1997) encerraram o show. O bis arrematou: Catedral (do LP dela de 1994) e Telegrama (PetShopMundoCão, lançado por Zeca em 2002).

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