Na semana passada, o jornalista Leandro Souto Maior mandou uma mensagem dizendo que estaria compartilhando com o colega de redação Ricardo Schott uma matéria para o jornal O Dia sobre a aprovação pela Câmara dos Deputados do projeto de lei que autoriza a publicação das biografias não autorizadas. Perguntou se, como autora de uma biografia de Zé Ramalho em processo de produção, eu gostaria de dar um depoimento sobre minhas expectativas. Como já conversamos muito sobre esse meu projeto, ele já sabia que tenho autorização do artista para escrever esse livro. Mas Leandro e Ricardo sabem também que, desde que Roberto Carlos conseguiu sair vitorioso na briga contra o biógrafo dele, Paulo César de Araújo, as editoras passaram a temer a assinatura de um contrato sem a avaliação do livro (pronto) antes. E que ainda tem artista que não concedeu entrevista a mim por algum medo que, sinceramente, não sei qual é (mas o povo do Procure Saber deve saber). Topei falar, claro (leia aqui)!
A matéria mudou, Ricardo a assumiu e o gancho passou a ser o lançamento de uma biografia do AC/DC, mas eu e Denilson Monteiro, autor de Dez! Nota Dez! Eu Sou Carlos Imperial e A Bossa do Lobo: Ronaldo Bôscoli, ganhamos espaço mesmo assim. Falei ao telefone por mais ou menos 15 minutos com o repórter que me entrevistou sobre o que acho, o que sinto e o que entendo sobre esse momento crucial para nossa história. Não coube tudo na matéria, claro. Por isso, resolvi escrever o que contei e ele para que você, que está de passagem pelo GarotaFM, entenda o meu ponto do vista sobre essa discussão. Lembrando que o projeto de lei ainda precisa da aprovação do Senado e sanção da presidente Dilma. Se não for aprovado, a história do nosso país vai ficar seriamente comprometida (mais do que lamentavelmente já é).
Desde já, agradeço a Leandro Souto Maior e a Ricardo Schott pela confiança e pelo espaço, muito importantes nesse meu caminho.
Consigo ver duas vantagens das quais poderei me aproveitar para finalmente conseguir terminar e lançar a biografia de Zé Ramalho, para a qual ganhei autorização do próprio em 2007 e na qual estou trabalhando de forma independente desde 2010:
Primeiro, acho que será mais fácil conquistar a confiança de personagens que ainda não aceitaram conceder entrevistas a mim. Nenhum disse que é por isso, mas eu desconfio que eles tenham medo de não poderem mudar a maneira como escreverei a história. O que é uma bobagem, porque, como jornalista, meu dever é narrar os fatos sendo fiel ao que me é contado. Os gravadores estão aí para registrar as conversas e nunca me opus à ideia de uma entrevista minha ser gravada também pelo entrevistado. A outra coisa boa é a abertura do mercado editorial, o que fará com que as editoras se sintam mais seguras para receber um livro que não renderá a elas processos judiciais tão complicados e que causem tantos prejuízos.
A biografia que estou escrevendo é autorizada, mas esses são os dois motivos que me impedem de terminar esse trabalho ao qual estou me dedicando com afinco… e que já mudou meu rumo profissional algumas vezes, mudando também a minha vida. Para alguns, pode parecer que estou enrolando, mas não são poucos os que sabem as dificuldades que venho enfrentando nesse processo. Já gastei uma grana bancando minhas pesquisas e deixando trabalhos de lado para conseguir estar numa viagem, numa entrevista ou transcrevendo a mesma. Só que tenho contas a pagar. E, no Rio de Janeiro, elas são altas (isso, acho que todo mundo sabe). Então, não tem jeito, não consigo parar tudo para me dedicar somente a esse projeto sem alguma ajuda financeira, coisa que não tive até agora (e que, no início, era o que eu buscava junto às editoras).
Já tentei editais, já conversei com uma dezena de editores, por telefone ou em reuniões marcadas por mim e/ou por eles, e já tentei a ajuda de agentes literários, que preferem não trabalhar com “biografias” porque sabem da dificuldade. Fiz um projetinho em PowerPoint em 2007, que uso toda vez que quero apresentar a ideia a um editor e que já foi alterado (ou melhor, atualizado) por mim mais de 10 vezes. Sempre respondo a quem pergunta se desisti: “Claro que não! Só estou sendo obrigada a fazer no meu tempo!”
Não posso negar que obtive sucesso em alguns momentos dessa peregrinação. Basta dizer que tenho uma pesquisa já bastante adiantada e algum texto já escrito. Um deles foi quando entrevistei Lula Côrtes, em Jaboatão dos Guararapes, numa Quarta-feira de Cinzas. Aproveitei um Carnaval de folga para dar um gás nas minhas pesquisas e fui para Pernambuco. Troquei blocos por papos com pessoas como Raul Córdula (não vale aqui contar a história dele com Zé Ramalho porque a mesma estará no livro). E, no fim da folia, estive com Lula, o primeiro parceiro de disco de Zé Ramalho (eles gravaram juntos em1975 Paêbirú, LP de estreia de Zé). O homem faleceu aproximadamente um ano depois. Foi sorte ou não ter conseguido desfrutar desse momento com ele?
Muito por causa dessa discussão, eu que sou formada em Jornalismo e em Letras, decidi ingressar no mestrado. Primeiro, para tentar entender o que torna a biografia um gênero tão polêmico. E, também, para buscar ajuda para a finalização do livro. Lá, estou conseguindo escrever mais do que antes. Tenho um orientador “meio que” substituindo o editor e, agora, um ano e meio depois de iniciar esse processo, tenho também muito mais entendimento da importância da biografia.
A biografia é só um dos documentos a que todo e qualquer povo deve ter acesso para entender a sua própria história. Vetar a publicação de uma biografia é censurar a própria história e colaborar com a formação de cidadãos alienados. Acho importante o biografado ter direito a resposta, mas os países desenvolvidos já provaram que o que faz o mercado de biografias prosperar é justamente a disputa entre biógrafos por escrever a melhor biografia.
O que o leitor, o editor, o biografado e seus parceiros medrosos precisam entender de uma vez por todas é que uma biografia é uma leitura de uma história. No meu caso, a minha biografia vai ser a minha leitura da história de Zé Ramalho. Sabe quando Maria Bethânia faz uma leitura de uma canção clássica brasileira? É quase a mesma coisa! Se ela cantar mal, quem paga mico é ela. No caso da biografia, traçando um perfil pessoal e profissional, eu me coloco inclusive como personagem coadjuvante dessa história que, se for mal contada, quem vai pagar mico sou eu. E, acredite, insistindo nesse projeto, quem está colocando o bolso e a cara a tapa também sou eu.
Estamos juntos Chris!! Desde 2010 venho acompanhando e apoiando você nesse projeto que me conquistou desde que nos conhecemos no marco zero. Apesar desse pensamento retrógrado desses movimentos ele vai sair e será um sucesso! Sempre contigo!